Emendas Impositivas

* As opiniões aqui emitidas não representam necessariamente a opinião do Instituto Genos

Em 2015, durante um período de extrema fragilidade do poder executivo, o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional 86 de 2015 que criou o instituto da Emenda Impositiva ao Orçamento.

Referida emenda alterou o §9º do artigo 166 da Constituição Federal, vejamos:

Art. 166. Os projetos de lei relativos ao plano plurianual, às diretrizes orçamentárias, ao orçamento anual e aos créditos adicionais serão apreciados pelas duas Casas do Congresso Nacional, na forma do regimento comum.
(…)
§ 9º As emendas individuais ao projeto de lei orçamentária serão aprovadas no limite de 1,2% (um inteiro e dois décimos por cento) da receita corrente líquida prevista no projeto encaminhado pelo Poder Executivo, sendo que a metade deste percentual será destinada a ações e serviços públicos de saúde. [Grifo nosso]

O orçamento anual é uma lei autorizativa, ou seja, o executivo prevê e elabora projeto de lei que, na sequência, será encaminhado ao legislativo. Por sua vez, o legislativo autoriza a execução das despesas destinadas ao funcionamento dos serviços públicos e outros fins adotados pela política econômica ou geral do país.

Em outras palavras, a execução de tal orçamento é de discricionariedade do executivo. Sendo assim, aos parlamentares competirá apenas a sugestão de recursos a programas de governo ou obras públicas. A emenda constitucional, no entanto, passa a impor que 1,2% da Receita Corrente Líquida tenha execução definida pelos parlamentares e seja obrigatoriamente executada pelo poder executivo.

Dessa forma, a Emenda Impositiva passa a ser um importante instrumento de financiamento de políticas públicas locais. O poder executivo, com suas camadas burocráticas e centralidade de agenda, relegará demandas locais a um segundo plano ou as encarará como desnecessárias, afinal, é seu papel a priorização de demandas.

O parlamentar, por sua vez, detém legitimidade para atender essas demandas locais que não são representadas pelo poder executivo e, nesses casos, poderá financiar as soluções para essas demandas através das emendas impositivas.

Em um ambiente de recursos escassos, a medida permite ao parlamentar ampliar a efetividade de sua atuação através da implementação de obras ou no fortalecimento de programas que objetivam o bem estar-social, seja da região que representa ou dos grupos de interesse que o elegeram. Não seria equivocado, portanto, perceber as emendas impositivas como uma importante fonte de financiamento de políticas públicas locais.

Há no senso comum quem diga que essas emendas são “identificadas como iniciativas paroquiais e fisiológicas, convertendo-se em objeto de tradicional desconfiança diante da opinião pública. A visão comum é que tais despesas têm motivação puramente política e não são justificáveis sob a ótica econômica. Em torno delas, construiu-se o mito da ineficiência alocativa”. (Dayson de Almeida, O mito da ineficiência alocativa das emendas parlamentares).

Ocorre que as características do nosso federalismo fiscal conjugadas com as regras legislativas para definição da peça orçamentária permitem “substanciais ganhos de bem-estar social”, conforme demonstra Dayson de Almeida em estudo citado. Assim, as emendas impositivas elaboradas pelos parlamentares é um instrumento legítimo para financiamento de políticas necessárias para uma minoria.

Por fim, deve-se destacar que em dezembro de 2019 o Congresso Nacional aprovou Emenda Constitucional 105 que define modalidades das transferências de recursos através das emendas parlamentares. A emenda impositiva ao orçamento, portanto, poderá alocar recurso aos entes subnacionais por transferência direta (transferência especial) ou mediante elaboração de convênio (transferência com finalidade definida).

Nos casos em que a emenda é executada via transferência especial, não há necessidade de um acordo entre as partes (convênio) com critérios definidos tais como objeto, meta, cronograma físico financeiro. Essas emendas são chamadas “Emendas Pix”, pois são recursos que são depositados diretamente na conta corrente do ente subnacional para execução do recurso em seus programas finalísticos, a quem caberá, inclusive, a prestação de contas do recurso.

Por outro lado, a emenda com finalidade definida (executada via convênio), diferentemente das emendas pix, são efetivadas após elaboração de acordo entre os entes, ou seja, necessitam apresentar o objeto da despesa, cronograma físico financeiro e todos os requisitos de convênio previstos pela Legislação 8.666/1993 e correlatas. Se essa emenda possui execução mais complexa por um lado, por outro lado ela pode ser designada a entidades sociais, como por exemplo a APAE — Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais, desde que esta instituição cumpra alguns requisitos.

A Emenda Impositiva demonstra um grande potencial de se tornar um exemplo de colaboração federativa através da distribuição de recursos para os Estados, Municípios e Entidades para que possam executar políticas públicas que não são prioritárias ao chefe poder executivo eleito, mas são, no entanto, políticas necessárias e que estão representadas pelos parlamentares.

Daniel Leão Bonatti

Vice-Presidente